Múltiplas são as possibilidades de se engajar em lutas sociais e diversas as tentativas de agir no mundo para transformar a realidade. Num inusitado exercício de cidadania, o escritor J. C. Ramos Filho optou pela poesia, associada à abordagem de questões candentes na sociedade contemporânea. Imprimir pequenos textos poéticos em embalagens de preservativos e distribuí-las aonde houver grande movimentação de pessoas é a forma criativa por ele adotada para colaborar em campanhas de prevenção da aids e de doenças sexualmente transmissíveis. Empenhado nesse projeto desde 1997, o poeta anda por aí, Brasil afora, distribuindo o que ele chama de “camisinhas poéticas”. Mais de 400 mil já circularam em diferentes regiões do Brasil e além das fronteiras nacionais. Só no dia da posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, 400 delas foram entregues ao público.
Nascido no Maranhão em 1953, João da Cruz (J. C.) Ramos Filho é analista judiciário lotado no Tribunal Regional do Trabalho de Santa Catarina e mora em Itajaí há quase 30 anos. Bacharel em Estudos Sociais e em Direito, sempre se interessou por questões que chama de ”doenças sociais”. Em 1998 lançou seu primeiro livro, “Água de cacimba”, já com a proposta de aliar poesia e prevenção. Desde então, conta com patrocínio da Inal Indústria de Látex Ltda, fabricante dos preservativos Olla, que fornece as camisinhas. Membro da Academia Itajaiense de Letras e da Sociedade Escritores de Blumenau, é cônsul em Itajaí da entidade internacional Movimento Poetas del Mundo.
Os textos impressos nas embalagens de preservativo estão reunidos nas páginas de sua segunda obra, “Fragmento essencial”, que tem a singularidade de ser o único livro pré-lançado nesse inusitado formato. A primeira edição é de 2004 e foi lançada com apoio da Lei de Incentivo à Cultura de Itajaí. Com apresentação escrita pelo então ministro da Saúde, José Serra, foi lançado no mesmo ano na Biblioteca do Senado, a convite do então presidente do Congresso, José Sarney, e no Centro Histórico de São Luís do Maranhão.
A terceira edição foi lançada em agosto de 2008 na Bienal do Livro de São Paulo, onde o escritor manteve contato com vários escritores, entre eles Fernando Morais e Marília Pêra.
Ao comentar a edição 2008 da Bienal de São Paulo, o escritor Moacyr Scliar escreveu em coluna do jornal Zero Hora: MOACYR SCLIAR “É isto mesmo: poesia numa embalagem de preservativo. A idéia é do escritor de Itajaí, João da Cruz Ramos, que com isto está, de acordo com suas palavras, preservando a poesia. Como escritor e médico de saúde pública, só posso aplaudi-lo: reúne uma ação de saúde a uma ação cultural. Poesia é arte, mas é saúde também; uma coisa completa a outra. Imaginem só esta cena: o cara lê para a parceira o poema que está na embalagem, com isto despertando a paixão dela; rapidamente coloca a camisinha e, pronto, temos sexo ardente e seguro. É um sonho de saúde pública transformado em realidade.”
Com destaque também no programa Jô Soares, em 2008 as camisinhas poéticas circularam na I Bienal Internacional da Poesia em Brasília, que integrou as atividades da 27ª Feira do Livro de Brasília.
No mesmo ano, J. C. Ramos Filho levou sua poesia para o Congresso Brasileiro de Prevenção das DST e Aids, em Florianópolis, onde apresentou seu projeto ao ministro da Saúde, José Gomes Temporão.
Mas a ação do escritor não se limita ao território brasileiro. Em 2007, ele participou do Fórum Social Mundial em Nairóbi, no Quênia, e visitou a Fundação Nelson Mandela em Johannesburg, na África do Sul, distribuindo mais de 10 mil preservativos no continente africano, onde vive um terço das pessoas portadoras do vírus HIV em todo o mundo, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).
No Fórum em Nairóbi, até o ministro Luiz Dulce, chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, e o cantor Martinho da Vila receberam camisinhas com fragmentos poéticos que falam não apenas de prevenção, mas também de amor, ecologia, preconceito racial, infância, fome, globalização, enfim, falam da vida. Ao se referir à iniciativa do poeta brasileiro, Oduor Ong’wen, membro do Comitê Organizador do Fórum, declarou: “Esperamos que as pessoas questionem o mundo em que vivem e apresentem mais alternativas como esta para criar um mundo melhor”.
Em 2009, durante o Fórum Social Mundial em Belém do Pará, os preservativos foram distribuídos no estande da Academia Itajaiense de Letras, próximo ao ginásio da Universidade Federal do Pará, e por toda a Universidade Federal Rural da Amazônia.
Afinal, J. C. Ramos Filho considera que poeta engajado tem de ir aonde o povo está, seja nas ruas, nas escolas ou em lugares de grande movimentação, no Pará ou na África, em Itajaí ou em São Paulo.
Ele vai… a pé, de avião, de barco ou de bicicleta, carregando e socializando sua mensagem, até com ajuda da Cruz Vermelha se for preciso. E os fragmentos poéticos às vezes viajam sem o seu autor. Este ano chegaram ao Uruguai, impressos em preservativos distribuídos pelo Ministério da Saúde daquele país em campanha nacional de prevenção de DST e aids.
É com essa ideia na cabeça e muita camisinha poética na sacola que o escritor transita por muitos eventos e lugares. Em outubro de 2009, lá estava ele no Centreventos de Itajaí, oferecendo sua arte aos visitantes da 23ª edição da Marejada – Festa Portuguesa e do Pescado.
Itajaiense de coração, o poeta demonstra seu carinho pela cidade em verso e em prosa: